segunda-feira, novembro 16, 2009

Entre a espada e a parede!




Longe vai o tempo em que o divórcio era visto como um tabu, como algo de profundamente repreensível. Em outros tempos era preferível ficar casado, mesmo quando o amor e o respeito tinham desaparecido, do que ser divorciada/o. Seria falta de coragem? Não sei, mas a razão mais citada para manter um casamento era o bem-estar dos filhos.

Enquanto filha de pais divorciados não posso, de maneira nenhuma, concordar com esta razão. As crianças são radares potentíssimos, captando coisas que até os adultos duvidam. A mais ligeira alteração é percepcionada por elas. Eu já fui criança e eu sei do que falo. Na minha opinião, e ela vale o que vale, é preferível que os pais se separem a continuarem a viver uma relação baseada na mentira, na discussão…

Mas claro que é necessário saber explicar isso aos filhos. É preciso sentarem-se todos no sofá e com palavras simples, calmas e cheias de amor dizer que embora os pais se separem isso não significa que o amor pelos filhos vá diminuir. É essencial. Assim como é essencial que continue a haver respeito entre os membros do casal. Infelizmente, é aqui que as coisas nem sempre correm bem.

Muitas vezes o divórcio não ocorre por mútuo consentimento, ou seja, por ambos quererem, mas antes por só um querer. Tal provoca discussões estrondosas entre 4. Discussões, frequentemente, presenciadas pelos filhos que não entendem o motivo de tanta gritaria, de tanto insulto, de tanto ódio. Eu pelo menos não entendia!

Chorei bastante quando os meus pais me disseram pela primeira vez que se iam divorciar. Separaram-se e depois, passado uns tempos voltaram a juntar-se. Sinceramente, detestei-os por isso. Pode não parecer bonito de se dizer, mas é verdade. Detestei os meus pais por isso. Detestei-os por me terem feito sofrer com uma separação, com uma ruptura de um lar, para depois, quando eu já estava habituada ao facto, voltarem a juntar-se. Na minha cabeça de criança só passam questões como “porquê se separaram se depois se voltaram a juntar?”, “porque me magoaram com aquela ruptura para depois voltarem um para o outro?”. Ainda não conseguia entender bem as coisas… Ou isso, ou apesar de ser ainda muito nova, sabia que aquela reconciliação não ia durar muito. Para ser sincera, não sei exactamente quanto tempo durou, mas o divórcio foi inevitável… E ainda bem! Sentir aquele clima pesado em casa, não haver diálogo, mas antes discussões frequentes não é ambiente no qual se queira viver permanentemente.

O divórcio chegou para meu grande alívio. Foi por mútuo consentimento, se assim se pode dizer. A minha mãe queria o divórcio, mas o meu pai não, mas apesar disso concedeu-lho. Como é normal o tribunal estipulou que de 15 em 15 dias devia passar o fim-de-semana com o meu pai. No entanto, a minha mãe nunca se opôs que fosse passar todos os fins-de-semana com ele.

Confesso que ir passar os fins-de-semana como meu pai era um suplício. Não que não gostasse de estar com ele, não me interpretem mal. Mas é que o meu pai não falava de mais nada a não ser da minha mãe. Tentava influenciar-me permanentemente. Não no sentido de eu odiar a minha mãe, não. Antes pressionava-me para eu lhe dizer que queria que eles voltassem. “Diz à tua mãe que estás triste por estarmos separados… Diz-lhe que queres que ela dê mais uma oportunidade ao pai”. Foi assim, todos os fins-de-semana durante 5 anos (se não me falha a memória). E quando não estava comigo telefonava-me a perguntar se já tinha falado com a minha mãe. Cheguei à triste conclusão que o meu pai só queria que eu fosse passar os fins-de-semana com ele para ver a minha mãe quando ela me fosse buscar. Mais nada.

Uma vez, já estava eu na faculdade (no 1º ano), não pude ir passar o fim-de-semana com ele. Ele telefonou-me e eu disse que não podia, pois tinha frequência na 2ª feira e tinha que estudar (e como já se viu em casa do meu pai tal era impossível). Ele ficou possesso, gritou comigo e desligou-me o telefone na cara. Foi a gota de água… Passei-me e liguei-lhe de volta. Chamei-o de mal-educado e disse-lhe que a única razão pela qual ele queria que eu fosse lá era para ver a minha mãe. Deitei tudo cá para fora! Na altura pediu-me desculpa mas a paz não durou muito tempo.

No fim-de-semana seguinte pediu-me para escrever uma carta à minha mãe. Ele ditava-me o texto e eu assinava como se fosse minha. O texto? A lengalenga do costume: “que eu queria que eles voltassem para ficar feliz” etc e tal. Eu disse que não. Que aquilo era um problema deles os dois e que não era justo ele envolver-me naquilo daquela maneira. Se a minha mãe não queria voltar ele tinha que aceitar isso. Resultado: não me falou no resto do fim-de-semana. Hoje sei que o meu pai era uma criança enfiada num corpo de adulto.

Hoje não falo com ele, por razões que não vale a pena expor aqui. Mas houve alturas em que estive entre a espada e a parede, sem saber para que lado ir. Houve alturas em que me senti desamparada, que me senti como “arma de arremesso” (não da parte da minha mãe, mas antes do meu pai), um meio para chegar a um fim, neste caso um meio para o meu pai voltar para a minha mãe.

Hoje sou uma mulher saudável. Graças a Deus não tenho traumas e pergunto-me como isso é possível. Não tenho aversão a compromissos nem a casamento. Mas sei que nem toda as pessoas são como eu. Nem todas as crianças tem uma mente forte para aguentar tudo e mais alguma coisa. Para aguentar serem ”bolas de pingue-pongue” atiradas de um lado para o outro e continuarem a manter a sua ingenuidade e sanidade mental.

Os pais deviam deixar de usar os filhos como arma, como um objecto para influenciar ou magoar o outro. Os filhos devem ser neutros e ponto. Devem deixa-lhos amar os pais como querem, sentir o que querem.

12 comentários:

Lia disse...

pois... mas qd os pais fazem de td p estragar a vida do outro e usam os filhos p isso é complicado, muito!

Purple disse...

Não pude deixar de me rever de alguma forma no teu relato.

Também sou filha de pais separados, os quais não estabeleceram uma relação saudável, e que por consequência me levou por arrasto.
Dramas à parte, cresci e aos 18 anos tomei a decisão de cortar relações com o meu pai, porque não tolero chantagem psicológica nua e crua e não cedo a manipulações de alguém que se devia preocupar com meu bem-estar.
E sabes que mais?! Foi o melhor que fiz!
Porque os pais nem sempre conseguem ser as melhores pessoas para os próprios filhos, e embora isto seja muito cruel é a dura realidade.
Cabe a cada um de nós ultrapassar tudo da melhor forma e não nos perdermos do caminho que traçamos.

E sim, uma historia de amor falhada na nossa família nunca deve servir de exemplo.
Porque tudo o que de melhor damos à nossa vida se resume na base para colhermos o melhor que ela nos pode dar.

Beiju

Anónimo disse...

Não é nada facil, estar entre a espada e a parede, seja porque motivos for...

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Olhos Dourados disse...

Não deve ser fácil!
Ainda bem que nunca passei por isso.

dinona disse...

UI...
eu também sou filha de pais separados, e digo-te que a melhor coisa que fizeram foi mesmo divorciarem-se, porque aquilo não era ambiente para ninguém.

Eu cortei relações com o meu pai, porque vesperas de eu fazer 17 anos ele ligou-me a dizer que não me daria mais pensão de alimentos e mais... dizia-me que só vinha almoçar comigo se a "mulher actual" também fosse... e embora eu me desse bem com ele porque apesar de tudo ele era meu pai, a partir do momento em que ele me fez esse ultimato eu virei-lhe costas.

Pepita Chocolate disse...

Não sou filha de pais divorciados, no entanto, entendo o que dizes. e já assisti a cenas idênticas às que descreves.
Uma das partes acaba por não aceitar que o casamento acabou e pressiona os filhos.

Acho que os filhos devem ser poupados; e se nãop se entendem, ao menos que entendam que já prejudicam os filhos, com a separação. Por isso, poupem-nos a jogos!

Beijoca!

Artemisa disse...

Lia...

Se é...

Bjx

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Purple...

Eu também não aturo pressões psicológicas e a partir desse momento a relação com o meu pai nunca mais foi a mesma.

Bjx

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Black Horse...

De facto não é.

Bjx

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Olhos Dourados...

Sorte a tua... Muitas crianças não têm essa sorte.

Bjx

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Dinona...

A atitude do teu pai não foi a melhor, tal como a do meu... Não conseguem distinguir o certo do errado...

Bjx

Artemisa disse...

Pepita chocolate...

Sim, devem ser poupados. No entanto, há pais que não tem discernimento para chegar a essa conclusão. Estão mais preocupados em magoar-se um ao outro que cuidar do bem-estar dos filhos.

Bjx

Patrícia disse...

Sou filha de pais juntos lol, mas sempre vivi um pouco esse ambiente de discusões e gritaria. Hoje sou mãe e divorciada. Eu e o meu ex damo-nos melhor agora do que quando estavamos juntos e não utilizamos de maneira nenhuma o menino como qualquer arma que pudesse ser. E consigo ver mais felicidade no meu filho do que "vi" em mim.

Girl in the Clouds disse...

Admiro a tua coragem para escrever este post sobre esta tua experiência de vida, que ultrapassaste e venceste.

Eu mesma... disse...

tnh uma experiencia parecida para contar, mas não aqui. quem sabe um dia escrevo te a contar um pouco mais de mim.
beijinhos.

Artemisa disse...

Patricia...

Ainda bem... :) O que importa é que o teu filho se sinta amado, estejam os pais juntos ou não.

Bjx

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Girl in the clouds...

Não nos devemos deixar abater pelos revesses da vida.

Bjx

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Anne...

Está bem :-) Não é para ser cusca, mas gosto de partilhar expiriências...

Bjx